No dia 20 de março deste ano, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) condenou o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) e seis associações que o integram por formação de cartel na fixação de preços e abuso de poder dominante pela criação de barreiras ao ingresso de novas associações no mercado (Processo Administrativo nº 08012.003745/2010-83).
Conforme se extrai do site da entidade, “O Ecad e as associações foram condenadas por fixação conjunta de valores a serem pagos pela execução pública de obras musicais, lítero-musicais e fonogramas. De acordo com o conselheiro relator do caso, Elvino de Carvalho Mendonça, a Lei de Direito Autoral (Lei 9.610/98) confere ao ECAD o controle da atividade de arrecadação e de distribuição dos direitos autorais, mas não o tabelamento de seus preços”.
“A livre negociação de preços impossibilitaria, ou, ao menos, dificultaria uma eventual prática de abuso de poder de mercado, haja vista que a precificação estaria mais sensível às necessidades do usuário, bem como seria mais eficiente em termos econômicos”.
Afora a ironia de o mesmo órgão já ter julgado a questão em outro procedimento administrativo, sob o número 08000.002511/97-19, entendendo diametralmente de forma oposta, referida decisão afronta princípios norteadores da matéria. Assim como o acórdão do Supremo Tribunal Federal, proferido nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 2054-4, que bem resolve o caso.
Disse o Supremo, naquela ocasião: “Trata-se, nesse último caso (fiscalização), aliás, como mostraram as informações, de normas que segue tendência internacional configurada em novos Acordos e Tratados que ampliam a proteção aos direitos de autor. De outra parte, convencem as informações, ao menos para esse primeiro exame da matéria, de que a experiência tem demonstrado, tendência que tem se revelado em todo o mundo, ser imprescindível, tanto por razões de ordem prática quanto econômica a gestão coletiva, unificada, de direitos autorais para uma proteção eficaz do direito”.
Vê-se que a natureza e a origem do sistema de gestão coletiva encontram-se próximas do enterro diante de flagrante decisão que subverte o sistema. O sistema unificado de gestão coletiva originou-se, justamente, pela dificuldade tanto por parte do titular em arrecadar, distribuir, administrar e fiscalizar quanto na pessoa do usuário que se encontrava cobrado a todo o momento pela mesma execução pública, em diferentes valores.
Como concluir que a livre negociação de preços tornaria “mais eficiente” o sistema? Como então permitir a fixação de valores de forma diferenciada pelos diversos titulares? A legislação determina um único escritório central em seu artigo 99, e a leitura do Título IV da Lei de 9610/98 (Das Associações de Titulares de Direitos de Autor e dos que lhes são conexos), em conjunto com os incisos XXVII e XXVIII, alínea “b” do artigo 5º da Constituição Federal, não permite titubeações quanto ao direito do escritório central, formado pelas associações mandatárias dos seus titulares, definir os parâmetros de fixação dos valores pela execução pública musical.
A forma pretendida e defendida na decisão proferida pelo órgão causará verdadeira balbúrdia, beneficiando somente os usuários que se aproveitarão da seara de dúvidas e incertezas, criadas pelo sistema pretendido na decisão, para negar o pagamento e permanecer violando direitos. Indago: CADÊ a coerência?
Luciano Oliveira Delgado é advogado especializado em Direitos Autorais.