Harmonias e dissonâncias
Todos gostam de música, muitos fazem dinheiro com ela, ninguém imagina a vida sem ela, mas como os seus criadores podem viver do seu trabalho? O assunto interessa não só aos compositores, porque envolve liberdade de associação e de expressão, quando se discute se o Estado deve participar da arrecadação e distribuição de direitos autorais no Brasil. Aqui, a arrecadação é feita por um escritório central, o Ecad, criado, administrado e controlado por sociedades privadas de autores musicais, como a UBC, a Sicam e outras. O Ecad cobra direitos dos que usam as músicas para ganhar dinheiro com elas (rádio, TV, shows, festas, publicidade, clubes ) e os repassa às sociedades, que os distribuem entre seus autores, proporcionalmente à quantidade de execuções públicas de cada música no período monitorado.
É um sistema correto e efetivo, que dá a cada um a sua parte pela utilização comercial de sua criação. Nos Estados Unidos e na Europa funciona muito bem. Se aqui há falhas, falcatruas ou ineficiência, o problema é de gestão e fiscalização, e deve ser resolvido entre o Ecad e as sociedades que representam os compositores, intermediados pela Justiça. O Estado não entende nada disso, e já morde 25% de impostos sobre direitos autorais sem tocar uma nota. Quando se canta o velho refrão de uma sociedade arrecadadora estatal, ouvem-se cabide de empregos, aparelhamento partidário, altos custos e burocracia. No mundo moderno, as sociedades de autores são empresas comerciais, que fazem tudo para ganhar o máximo de dinheiro para seus associados. Como qualquer empresa, competem no mercado, buscam eficiência administrativa, novas tecnologias, prestam contas, são auditadas, podem ser processadas e liquidadas legalmente. O que é que o Estado tem a ver com isso? Pode soar como pleonasmo ou redundância, mas é uma evidência: quem tem a autoridade é o autor, quem criou é que decide o que se faz ou se deixa de fazer com a sua criação. Cabe à Justiça julgar os conflitos com base na legislação (que precisa ser modernizada), e ao Estado garantir os direitos e o cumprimento da lei. Já é muito.