Música tem dono!
No início do mês, o juiz Maurício da Costa Gamboji, da 8ª Vara Cível do Foro de Porto Alegre, sentenciou um processo antigo. O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) entrou com uma ação contra as salas gaúchas da rede de cinemas Arteplex, quanto ao pagamento de direitos autorais referentes à trilha sonora dos filmes exibidos. A advogada do Ecad, Alessandra Vitorino de Albuquerque, explica tratar-se de uma tutela inibitória: É uma ação de inibição do ilícito, cujo objetivo é justamente a abstenção da utilização desautorizada de música. Combinado a isso, foi feito o pedido de indenização, ressarcimento pelas perdas e danos, que se traduzem nas mensalidades que deixaram de ser quitadas desde a primeira execução, de novembro de 2007 até agora .
Segundo a sentença, o cinema tem de destinar 2,5% da sua renda bruta mensal para o pagamento dos direitos e ainda deveria se abster da execução de músicas em suas atividades até obter a licença autoral prévia. Alessandra compara essa licença a qualquer outra conferida por um órgão público: É uma compensação financeira pela utilização da obra. Na verdade, a autorização prévia é a licença e o consequente recolhimento de direito autoral . Quanto ao repasse para os autores, a advogada esclarece que os exibidores encaminham borderôs (planilhas digitalizadas) com o público de cada sessão. Vem o nome de cada música inserida naquele filme. No Ecad, é feita a identificação de todos os titulares. A partir disso é feito um rateio, proporcional à receita de cada título.
A legislação atual que rege os direitos autorais (Lei Federal nº 9.610/98) determina que haja autorização prévia onde há execução de música em local de frequência coletiva, sem mencionar fins lucrativos. Dessa forma, até cineclubes ou sessões gratuitas em universidades necessitam de quitação com o Ecad. Porque a Constituição Federal determina que é um direito fundamental e exclusivo do autor autorizar ou não o uso, e isso independe de qualquer condição de lucro. A obra é um bem móvel de propriedade de terceiro , afirma Alessandra.
O Arteplex tem prazo recursal para recorrer ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em segunda instância. A gerência local das salas informou que o processo está com o Departamento Jurídico de São Paulo, mas que não havia chegado em Porto Alegre a informação de que haviam perdido e acredita que o cinema vai recorrer. Até o fechamento da reportagem, o setor jurídico da rede não havia retornado o contato.
Segundo Alessandra, o segmento já foi mais resistente: Hoje, estamos vendo que os cinemas estão se quedando à Lei de Direito Autoral e buscando regularizar sua situação junto ao Ecad. Tanto é assim que nós tivemos um crescimento de arrecadação do ano de 2008 para 2009 de 38% . A advogada narra que o Superior Tribunal de Justiça superou a tese dos exibidores de que não haveria como dividir o filme, separar a obra musical da obra audiovisual. A partir do momento em que o autor consegue inserir uma música na obra audiovisual, não significa que ele está abrindo mão do direito de execução pública futura dessa obra, que é outro direito, que ele pode exercer. A decisão do juiz de 1ª instância do Rio Grande do Sul segue o posicionamento já firmado pelo STJ.
O GNC do Shopping Praia de Belas é um dos exemplos de cinema em Porto Alegre que está de acordo com a lei. Eles pagaram todo o passado e se comprometeram a obter a licença prévia com relação à execução de música , diz Alessandra. O processo que acionava o Praia de Belas Empreendimentos Cinematográficos já estava na esfera do STJ e foi firmado um acordo judicial em 2009.
Por uma política de autor
Um trabalho de conscientização. É como o gerente da unidade do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição no Estado, Alvino de Souza, sintetiza a função de valorizar a propriedade intelectual. O Ecad não multa, não manda ninguém desligar o som. O técnico chega e conscientiza da retribuição autoral, para dizer que a música tem um dono e precisamos dar valor a esse dom de criação.
O gerente explica que o valor do direito autoral é estipulado de acordo com o ramo do negócio. A importância da música para um consultório médico é bem menor do que para uma boate, que não sobrevive sem ela. Por isso, o custo do som ambiente depende de uma fórmula que leva em conta a área do estabelecimento e o Ecad arrecada diretamente de locais que cobram ingressos: para as casas de diversão, é 7,5% da renda bruta; já nos cinemas, 2,5%. Informações e simulações de cálculo em www.ecad.org.br.