O PLS 129/12 é uma afronta à democracia e à cultura brasileira, devendo por isso ser rejeitado pelo Senado. Caso este não o faça, a desconfiança que a sociedade nutre pela classe política, ora expressa nas manifestações de rua, estará mais que justificada, infelizmente.
Como já denunciado pelo HP, este PLS consiste numa aberração jurídica que propõe a interferência governamental no funcionamento das entidades privadas de classe que administram os direitos autorais dos criadores musicais do país. Inconstitucional sob vários aspectos, o projeto fere acintosamente cláusulas pétreas da Carta Magna, como o direito de associação e organização livre de qualquer tutela estatal e o direito exclusivo dos criadores em dispor de suas obras, inclusive fixando-lhes preços e estabelecendo os critérios para a distribuição dos respectivos direitos. Tudo isso é desrespeitado pelo PLS 129/12, que, além de afrontar a cidadania, investe ainda contra decisões definitivas do STJ e do STF, contrariando também normas de Convenções e Tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Mais grave é constatar que esse PLS – que não é fruto do processo legislativo ordinário, vez que teve origem numa CPI suspeita, mal-conduzida e que se reunia sem quórum -, visa prioritariamente o desmonte das instituições que administram os direitos autorais no Brasil, certamente para favorecer algumas corporações da comunicação que conjuntamente devem hoje ao ECAD cerca de 2 bilhões de reais. Assim como a tal CPI, o PLS 129/12, seu subproduto, consiste numa manobra voltada para dar um calote bilionário nos criadores musicais brasileiros. Pela dignidade do parlamento, nossos senadores não podem permitir que a Casa a que servem se transforme em avalista dessa iniciativa para favorecer devedores contra credores. Nunca é demais lembrar que, nas ruas, S. Excia. o Povo está de olho em tudo isso.
INTERESSES
Ao longo dos últimos anos, várias empresas de comunicação (principalmente grupos de TV aberta e fechada) vêm sendo continuamente condenadas judicialmente a pagar o que devem às entidades gestoras dos direitos dos criadores musicais. No entanto, para fugir das determinações da Justiça, essas corporações não só adotam a velha estratégia de desqualificar o credor como, na impossibilidade de descumprir as decisões dos tribunais, resolvem simplesmente trabalhar para revogar as leis que garantem os direitos dos trabalhadores da música. É exatamente esse o papel do PLS 129/12, que, gestado numa CPI midiática, presidida pelo esvoaçante senador Randolfe Rodrigues, teve a leviandade de acusar sem provas, ainda que não tivesse sequer a capacidade de produzir um relatório próprio: sem disfarçar interesses, o relatório da CPI foi encomendado aos representantes brasileiros do Creative Commons, movimento financiado por organismos multinacionais (Google, Fundação Ford e outros) que buscam a flexibilização dos direitos intelectuais em todo o mundo, tendo como estratégia a difamação das entidades de cobrança de direitos autorais. Tudo isso com o fim de gerar mais lucros para as empresas de comunicação e provedores da Internet que recusam pagar corretamente os direitos dos criadores, embora lucrem fabulosamente com seus negócios, nada gratuitos, por sinal. Foram esses senhores que redigiram também o PLS 129/12, que afora o desplante de contrariar frontalmente o princípio não-intervencionista expresso na Constituição Brasileira, comete até a leviandade de propor a criação de um monstrengo estatal para garrotear as entidades de classe dos artistas brasileiros. Um novo cabide de empregos a serviço da antidemocracia, absurdamente cogitado no próprio momento em que a Presidente Dilma, diante da crise econômica que se desenha, propõe o enxugamento da máquina de Estado e até mesmo a diminuição do número de ministérios.
O Senado brasileiro não pode compactuar com tanta insensatez. Os direitos autorais e as organizações dos artistas brasileiros não podem ficar à mercê de ineficientes burocratas governamentais, principalmente dos que atuam em prol dos interesses do poder econômico, não da cultura e da democracia. Até porque, como este HP tem demonstrado à exaustão, depois de ter permitido a desindustrialização do país, de ter quase quebrado a Petrobras, de ter sangrado recursos do BNDES com subsídios a grandes corporações e de ter cometido tantos desatinos similares, não compete ao governo gerir direitos privados dos cidadãos, como tal resguardados expressamente pela Carta Magna.
Ainda que alguns artistas desavisados (geralmente privilegiados que clamam por tetas do Estado para poderem mamar mais e melhor) venham a público, deslumbradamente, apoiar o PLS 129/12, cabe repetir: esse projeto é inconstitucional, antidemocrático e ofensivo à cidadania e à cultura, favorecendo apenas os grupos econômicos que querem à todo custo subjugar os artistas brasileiros, tutelando-os como cidadãos de segunda classe, oprimindo suas organizações de classe e deixando de pagar os direitos que lhes são devidos por lei. É um projeto a favor dos exploradores e contra a cultura nacional, e como tal deve ser repudiado. Esperamos que o Senado o faça.
ANDRÉ SANTANA
Fonte: Ecad / Hora do Povo