O direito de receber
CLARISSE ESCOREL
O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) foi instituído por lei, em 1973, e mantido pela atual Lei 9.610, de 1998, como uma solução para o caos que existia até então, que dificultava aos compositores, intérpretes e músicos receberem pela execução pública de suas músicas. A cobrança da retribuição autoral sobre as músicas executadas nos quartos de hotel está prevista pelo artigo 68, §3º da Lei 9.610/98, e esse entendimento já foi confirmado pelo STJ. Não há, portanto, qualquer arbitrariedade na cobrança efetuada pelo Ecad na medida em que os aposentos de hotéis são considerados locais de frequência coletiva.
No que se refere ao valor cobrado por quarto pelo Ecad, tais valores são baseados em critérios internacionais e determinados pelas associações de música que compõem o Ecad e que representam os artistas a elas filiados. O cálculo leva em consideração a taxa média anual de ocupação dos quartos, bem como a média de utilização dos aparelhos de som, conforme determinação do STJ (súmula 261), que diz que a cobrança de direitos autorais pela retransmissão radiofônica de músicas, em estabelecimentos hoteleiros, deve ser feita conforme a taxa média de utilização do equipamento.
O Ecad utiliza, desde então, pesquisa realizada pelo Ibope, que define a média de utilização de aparelhos de rádio e TV nos quartos. Não se trata de interpretação equivocada da lei por parte do Ecad, mas sim de desconhecimento dos fatos. É absurdo o raciocínio de que a cifra de R$3,5 milhões, relativa aos direitos autorais dos 22.500 quartos que utilizam música, é "retirada" do turismo. Tal valor deixará de remunerar os titulares – cujo direito autoral encontra-se protegido por lei – para, em vez disso, aumentar o lucro e enriquecer os proprietários de hotéis.
Desafina quem afirma que os meios de hospedagem poderão aplicar os valores cobrados pelo Ecad em melhorias, capacitação de pessoal e construção de novos meios de hospedagem utilizando música em seus estabelecimentos, gratuitamente, na medida em que milhares de titulares terão suas obras exploradas economicamente através da sua execução pública, sem que por isso recebam um centavo sequer.
O pano de fundo dessa questão não é moral ou legal, mas econômico. O que está em jogo é a luta pelo direito de receber o que os criadores entendem ser justo pelo uso de suas obras por poderosos usuários de música interessados em enfraquecer e desmoralizar o Ecad, para assim continuarem usufruindo de bens de terceiros, sem pagar por isso. A criação do Ecad foi um desejo da classe artística e um avanço na administração dos direitos autorais de execução pública musical no Brasil. Um exemplo de democracia e respeito aos interesses dos autores.
CLARISSE ESCOREL é gerente executiva Jurídica do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad).