Leia abaixo o texto publicado no blog "Direito do Autor" em resposta ao presidente do Cade e assinado por Fernando Brant, Ronaldo Bastos, Abel Silva e Sandra de Sá
Procure saber
No dia 12 de abril foi publicada em um jornal de grande circulação do Rio de Janeiro uma entrevista do Sr. Vinicius Carvalho publicada no caderno de Economia. A chamada para a matéria diz assim: “Condenamos o Ecad, não o artista, diz Presidente do Cade”, abaixo está escrito “Multa de R$ 38 milhões colocou os dois órgãos em pé de Guerra”.
O Presidente do Cade afirma que o Ecad usa argumentos de cunho terrorista. Diz que o Ecad acusa o Cade de ter decidido em favor de um cartel e afirma que isso não é verdade. Diz ele que condenaram o Ecad e as associações que o integram porque não representam os autores e artistas de forma adequada.
Ora, Sr. Presidente, o que é isso? Isso é jeito de uma autoridade falar? O que significa “cunho terrorista”? Se defender e expressar opinião é terrorismo, desde quando? Fomos atacados, estamos ameaçados e não podemos expressar nossa revolta? Seremos chamados de terroristas por dizer que não concordamos com a forma que fomos tratados pelo Conselho presidido por V. Sra.? Cuidado, Presidente, já vimos esse filme antes. Já vimos muita gente ser chamada de terrorista e penalizada por dizer o que pensa. Naquele tempo, talvez o Presidente ainda não fosse nascido, ou era muito jovem. Mas era assim mesmo, procure saber.
Além disso, Presidente, por acaso V. Sra é representante de compositores, artistas e músicos? Faz parte de suas atribuições, ou do Cade determinar qual a forma adequada de representar compositores na gestão de seus direitos de execução pública? Por acaso essa foi a razão da condenação que nos foi imposta? A Lei que foi usada para nos condenar fala sobre a forma adequada de representar compositores?
Mais adiante o Presidente diz que o Ecad foi condenado por abuso de poder econômico e classificou de extorsiva a taxa de administração cobrada pelo Escritório e as associações. Ainda diz que nenhum outro negócio tem essa margem de retorno e que o Cade considera que teria de ser no máximo 20%. Ora, Sr. Presidente, não fica bem para uma autoridade na sua posição mostrar que pensa que a taxa de administração do Ecad e das associações pode ser comparada com a margem de lucro de uma empresa, ou demonstrar que não sabe que o valor retido a título de percentual de administração é integralmente usado até o último centavo para permitir que os autores e demais titulares de direitos autorais de música recebam seus rendimentos.
Procure saber, Sr. Presidente, o que custa mover essa máquina da gestão coletiva no Brasil. Procure saber o quanto se gasta para conseguir receber direito autoral de empresas de radiodifusão e demais usuários que se recusam a pagar. Procure saber quantas pessoas estão diretamente envolvidas nessa administração, como ela opera, quanto se investe em tecnologia e melhorias de sistemas. Não fale daquilo que não entende, isso não é adequado para o Presidente do Cade. É de se esperar que o SuperCade estude o funcionamento da organização a ser julgada, não é? Por exemplo, o Cade sabe qual a margem de lucro, ou o percentual gasto na operação e no fornecimento dos serviços contratados pelo usuário das operadoras de TV por assinatura? De acordo com a ABTA em 2012 faturaram 16,9 bilhões de reais.
Procure saber também qual a taxa de administração das organizações congêneres na América Latina e depois diga quantas cobram menos que 30% e quantas cobram 20%, ou menos? Tudo bem, América Latina não vale, vamos aos Estados Unidos e principais países da União Europeia. De fato, cobram menos, mas, nesse caso, procure saber quanto arrecadam e qual a principal fonte de receita. Nos Estados Unidos, por exemplo, 80% dos cerca de 2 bilhões de dólares arrecadados por ano, vem da radiodifusão. O que isso significa? Simples: o custo de arrecadação é baixo. O dinheiro entra e o custo de administração destina-se ao trabalho de distribuição.
Como pode o Presidente afirmar que a multa de 38 milhões só pode sair da taxa de administração? Essa é a comprovação de que o Cade realmente não entende nada de gestão coletiva de direitos autorais. Todo o dinheiro que está no Ecad e nas associações é direito autoral, claro que é, pois foi arrecadado a título de direitos autorais de execução pública de música. Achar que tem um parte do dinheiro que não é gasto na própria operação de arrecadar e distribuir, ou que a taxa de administração é como o resultado operacional de uma empresa comercial é tão absurdo quanto achar que esse dinheiro existe, está guardadinho para pagar a multa. E se prepare, Presidente, porque as mudanças demandadas pela decisão do Conselho, vão gerar um aumento exponencial no custo efetivo de administração. Quem vai pagar a conta?
Mais adiante o Presidente afirma que o estatuto do Ecad, criado pelas associações que o integram, não permite a entrada de novas associações. Ao mesmo tempo, diz que nos demais países há apenas uma associação, regulada e fiscalizada. Procure saber, Presidente, porque nem sempre a regulação e/ou a fiscalização é certeza de que tudo funciona de forma adequada. E afinal de contas, o Cade acha que devem existir quantas associações quantas forem criadas, todas abrigadas sob o Ecad fiscalizado e regulado, para que possam competir, ou entende que deveria existir apenas uma?
Ou seja, Presidente, falando desse jeito aos jornalistas Vossa Senhoria provoca uma pergunta que não pode calar. Quem lhe nomeou presidente do Cade? Como se dá o processo de escolha e o que nós compositores e demais profissionais que vivem de música podemos fazer para que o Conselho seja dirigido de forma adequada?
Fernando Brant
Ronaldo Bastos
Abel Silva
Sandra de Sá
Fonte: http://direitodoautor.wordpress.com/