Marcelo Camelo: poesia e violão
Neste final de semana a poesia chega de mansinho à Capital. Após três passagens por Porto Alegre nos últimos dois anos, Marcelo Camelo sobe, pela primeira vez, ao palco do Theatro São Pedro (Marechal Deodoro, s/nº) com o show Voz e violão. O cantor e seu companheiro de cordas se apresentam no sábado, às 21h, e no domingo, às 18h. Os ingressos estão esgotados.
Apostando em um repertório amplo, Camelo mescla canções da época dos Los Hermanos com as da carreira solo, e dá lugar, até, a composições famosas nas vozes de outros intérpretes, como Cara valente (Maria Rita). Músicas como Pra te acalmar, Morena, Samba a dois e Janta, executadas no show desta turnê em São Paulo, ganharam roupagem inédita.
Conhecido por transitar entre estilos como MPB, rock e pop, Camelo iniciou sua carreira em 1997 como vocalista e guitarrista da banda Los Hermanos. Hoje, ele se dedica ao trabalho individual, com dois álbuns lançados, Sou eToque dela.
Panorama – Qual a sensação de trocar um grande espetáculo com milhares de fãs, como na última turnê dos Los Hermanos, pela nudez da apresentação embalada por voz e violão?
Camelo – São coisas bem diferentes na prática, porque a banda e a guitarra são forças que se conjugam para fora, são extrovertidas. O violão é diferente, é sedutor, para dentro, mais puxa do que empurra. Então o princípio muda. Mas a música é sempre um canal de comunicação com a gente mesmo, nosso interior. Muda o caminho, mas o lugar de onde sai é o mesmo.
Panorama – Por que voltar às composições antigas, inclusive as que você nunca gravou em estúdio, neste momento?
Camelo – Eu nunca pude tocar algumas músicas porque não se adequavam ao formato de banda de um jeito que me agradasse. Se elas vão bem ao violão, me parece uma oportunidade única de tocá-las.
Panorama – Você já disse que mais de uma vez desconstruiu a sua imagem e revelou algo novo para si e para o público. Como funciona esse processo de reinvenção?
Camelo – Gostaria de me sentir assim, não sei se consigo fazer isso com tanta eficiência como você descreve. Mas o processo de fazer música põe a gente em perspectiva diante de coisas que não falaríamos a não ser nestas circunstâncias. Essa possibilidade de se ver, de se dar proporção, modifica mesmo quem somos. Na hora de retomar esse diálogo consigo mesmo já estamos em outro lugar, sem perceber.
Panorama – Você cedeu por cinco anos os direitos do álbum Toque dela à Universal. Porém, em tempos de internet, ter o direito das músicas não é garantia de retorno financeiro. Então, como capitalizar a música para sobreviver e criar novos trabalhos?
Camelo – Hoje quase toda a minha remuneração vem do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), referente à execução pública, o que me permite viver com algum conforto. O dinheiro que ganho no show é praticamente todo gasto em discos, DVDs e novos shows. O valor da venda de álbuns e DVDs, por sua vez, é praticamente inexistente, e está sendo capitalizado pelas empresas que disponibilizam esta informação gratuitamente.
Panorama – Como você vê a influência das suas composições nos trabalhos da nova geração da música brasileira (como Cícero, Tiê, Céu e Silva etc)?
Camelo – Acho que protagonizamos, no Los Hermanos, uma mudança de paradigma no consumo de música jovem, que foi gradual – mas ocorreu de fato -, ao longo dos nossos dez anos de existência. Mas dizer que todos que navegam por este lugar diferente em que a música está são diretamente ligados a nós seria injusto. Eu vejo em alguns, mais do que em outros, ecos dos códigos que usamos, mas acho que esta cena nova é bem heterogênea. E isso é símbolo de uma geração a que foi permitido o consumo de informação multilateral, ao contrário de quando começamos a tocar.
Panorama – Os temas das suas canções normalmente citam amor e sentimentos. Nunca sentiu vontade de fazer canções com cunho mais político?
Camelo – Não me interesso por fazer política diretamente. Procuro atuar em algum lugar anterior a estas divisões partidárias. Onde o sentimento nasce. E mais do que ensinar alguém, procuro estar do lado, fazendo companhia. Não tenho vocação pra escrever sobre as coisas, me sinto mais confortável ao escrever com elas.