(Diogo Dreyer)
As músicas Festa no Apê, do cantor Latino, e Atoladinha, da funkeira carioca Tati Quebra Barraco, foram campeãs de popularidade em 2005 de uma das maiores febres de serviços de celulares no Brasil: o download de toques de campainhas, ou ringtones, como são conhecidos. Latino foi o mais baixado pelos usuários da operadora Vivo e a funkeira foi a melhor colocada durante vários meses do site Ligaki, maior fornecedor independente de ringtones para as empresas de celular no Brasil. E por trás desses barulhinhos nem sempre agradáveis para os ouvidos alheios, existe uma indústria que fatura US$ 2 bilhões por ano no mundo todo. Nos Estados Unidos, devido a essa quantidade toda de dinheiro, muitos compositores estão se especializando em criar apenas ringtones.
No Brasil, a estrutura está cada vez mais profissional e envolve negociações com gravadoras como Warner, Sony BMG, Universal e Trama. De olho no aumento acelerado do uso de ringtones no País, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), órgão responsável pela arrecadação de direitos autorais, prepara-se para obter um pedaço dessa receita: notificou até agora nove operadoras de telefonia móvel e 22 integradoras – empresas que preparam e fornecem conteúdo para celular – para que elas passem a recolher uma taxa de execução pública das músicas transformadas em campainhas.
Segundo Márcio Massano, coordenador de shows e eventos do Ecad, a estimativa do órgão é que no Brasil os ringtones gerem receita entre 80 a 90 milhões de reais para as operadoras de celular. “O escritório defende cobrar 2,5% sobre o faturamento de cada ringtones baixado pelo usuário”, diz. E a vontade da entidade ainda á cobrar essa taxa também sobre o faturamento já obtido no passado. A intenção inicial do Ecad era de cobrar entre 5% e 7,5%, mas baixou a alíquota para ver se consegue viabilizar a cobrança. “A taxa refere-se à execução pública e não ao direito autoral propriamente”, diz Massano, já que em geral o direito é negociado entre a gravadora e o artista.
O coordenador revela que o escritório já teve conversas com essas operadoras e que se chegou a um impasse sobre quem pagaria a retribuição. “As operadoras dizem que já compram o conteúdo pronto das integradoras, que são responsáveis por disponibilizar o conteúdo dos serviços. Então essas empresas deveriam arcar também com esse custo”, diz Massano. O Ecad baseia sua reivindicação no fator disseminatório, alegando que a cobrança dos direitos autorais inclui a transmissão ao usuário que baixa a música e também à exibição pública dos ringtones. “Quando a campainha toca, chega aos ouvidos de todos os que estão ao redor do aparelho e não apenas do dono do celular”, diz Massano. Por enquanto, nenhum valor de exibição pública tem sido cobrado.
O Estado procurou as operadoras de celular que operam no Paraná para saber a posição das empresas quanto ao assunto. A Claro enviou uma nota na qual afirma que, junto com a Associação Nacional dos Prestadores de Serviço Móvel Celular (Acel), já informou ao Ecad que não concorda com a nova resolução do órgão. A operadora, de acordo com a forma estabelecida pela Lei Federal de Direitos Autorais 9610/98, entende que não há execução pública dos ringtones e que recolhe as taxas devidas às editoras musicais, às gravadoras e aos artistas.
A TIM, através da sua assessoria de imprensa, avisou que quando fecha o contrato com as integradoras já o faz com todos os direitos envolvidos, onde já estão incluídos todos os custos para divulgação das músicas. Então a operadora não se vê no dever de ter que pagar outras taxas, pois já entende cumprir todas as exigências legais. A Brasil Telecom informa que a questão está sendo avaliada pelo seu departamento jurídico. A Vivo informou que não concorda que os ringtones sejam exibição pública e que se pronuncia sobre o assunto também através da Acel.
A posição oficial da Acel é que não há transmissão ou execução pública nos ringtones. “O toque do celular é de uso privado da obra musical pelo usuário”, diz a assessora de estratégias regulatórias da entidade, Ana Luiza Valadares Ribeiro. Segundo ela, a conclusão do setor já foi manifestada ao Ecad e as operadoras notificadas vem reiterando essa posição. “As operadoras de celular, os processadores e os fornecedores de conteúdo já pagam os direitos autorais em contratos diretos com as gravadoras e as editoras de música, portanto, diretamente aos autores”, afirma.
O caminho mais provável para solucionar o impasse é a ida da discussão ao Judiciário.
Downloads são consumidos principalmente por jovens
As estimativas dos segmentos envolvidos, inclusive do Ecad, talvez mostrem um dos poucos itens sobre o qual há consenso nesse novo mercado: o de que os downloads de ringtones estão em franca ascensão. Em 2003, foram 22 milhões em downloads de campainhas no País. Em 2004, o volume saltou para 70 milhões e, para 2005, as estimativas chegam a 100 milhões. Os downloads são consumidos principalmente por jovens entre 12 e 22 anos que pagam entre R$ 1,50 e R$ 6,50 por música baixada. O preço varia de acordo com a sofisticação do ringtone.
Aqui vale uma ressalva: ringtones são divididos em três categorias. A primeira, e disparadamente mais popular no Brasil, é a de toques monofônicos, que detém mais de 50% da marca de downloads. A segunda divisão é a de toques polifônicos, para telefones mais modernos e com sons mais elaborados. A terceira é a de truetones, que ainda não está na nova regulamentação do Ecad, e que toca trechos reais das músicas em formato MP3. “O volume dos truetones ainda é pequeno e deve entrar numa futura regulamentação que envolva todo o tipo de download desse tipo de arquivo musical”, explica o coordenador do Ecad, Márcio Massano.
Pendengas à parte, as operadoras festejam o sucesso dos ringtones por serem um tipo de serviço que surgiu sem muita expectativa e que hoje é o principal serviço de conteúdo dessas empresas. “Quanto começamos a oferecer ringtones, tínhamos apenas 32 toques e uma categoria. Agora temos uma gama de 3 mil toques em 52 categorias diferentes”, explica André Mafra, gerente de conteúdos da Vivo, que já ultrapassou a média de 2,5 milhões de downloads por mês.
Somente na Vivo, mais de um milhão de downloads do tom musical Festa no Apê foram feitos em todo o País, um recorde absoluto nunca antes atingido por nenhuma outra música no Brasil. Outro tipo de ringtone campeão de popularidade são os hinos de futebol. “No grosso, é uma das categorias mais acessadas. Mas como existem muitos tipos, não existe nenhum que atinge número maior do que as das músicas”, diz o gerente.
A Claro foi a primeira operadora a lançar Hits MP3 no mercado brasileiro, e tem parcerias com grandes gravadoras, como Universal Music, Warner Music e Sony BMG, além de Building Records e Trama, por vezes até mesmo realizando lançamentos antes dos discos chegarem às lojas. No começo deste ano, uma operadora americana lançou o ringtone da música Speed of Sound, do grupo britânico Coldplay, antes da chegada do disco às lojas. Até então, as operadoras, no máximo, coincidiam os lançamentos. Agora começam a lançar as músicas em primeira mão.
A operadora, aliás, tem uma ligação estreita com o rock. Para patrocinar festivais em todo o País, utiliza os ringtones como parte de estratégias de divulgação. Somente no início de 2006, é responsável por trazer as turnês A Bigger Bang, dos Rolling Stones, e Vertigo Tour, dos irlandenses do U2, que contam com conteúdos exclusivos para os usuários da operadora.