Entrevista – Gabriel Valois
No mês passado, Gabriel Valois, diretor regional Norte/Nordeste do ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) esteve em Aracaju, cobrindo férias do gerente da Unidade Sergipe/Alagoas, Márcio Gama. Para quem desconhece, o ECAD é responsável pela arrecadação e distribuição dos direitos autorais de execução pública de músicas em todo o Brasil.
O ECAD é uma sociedade civil e privada que completa este ano seu 30º aniversário e, além da sede em São Paulo, possui 23 unidades próprias nas principais cidades do país. A Unidade de Sergipe/Alagoas, que foi aberta há um ano e está localizada no Edifício Cidade de Aracaju (Calçadão da João Pessoa, sala 201), já vem apresentando uma boa arrecadação desde que foi inaugurada. Houve um crescimento de 22 % nos últimos dois anos (valores arrecadados em 2006, comparados aos anos de 2004 e 2005).
Na entrevista concedida com exclusividade, ao JORNAL DA CIDADE, Gabriel Valois, que está como diretor regional Norte/Nordeste do ECAD há três anos, esclareceu o funcionamento do ECAD e os investimentos realizados na última década, em tecnologia, melhoria dos processos, controle dos padrões operacionais e qualificação da equipe. Confira agora trechos da entrevista: w JORNAL DA CIDADE – Quando um livro é vendido, a editora fica responsável por pagar os direitos autorais ao escritor. No caso da execução de uma música, é o ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) que se responsabiliza por arrecadar e distribuir os direitos autorais do compositor?
GABRIEL VALOIS – No caso do direito à execução pública, que é a parte que o ECAD faz a arrecadação dos direitos autorais, 75 % do que arrecadamos são dos titulares dos direitos autorais (compositor, intérprete), 7% são das associações e 18% do ECAD. Essas porcentagens para o ECAD e as associações (ABRAMUS, AMAR, SBACEM, SICAM, SOCINPRO, UBC, ABRAC, ASSIM, ANACIM e SADEMBRA) servem para se autogerirem, já que os associados nada pagam ao ECAD ou às associações.
w JC – Se a música de um artista é tocada numa micareta ou num grande show, por exemplo, por conta de pedidos dos fãs, como é realizada a fiscalização pelo ECAD dessa execução?
GV – Na realidade existe um artigo na lei dos direitos autorais, que obriga ao produtor do evento, após a execução das obras musicais, a entregar ao ECAD a relação das obras executadas. Isto acontece justamente após o show porque existe a possibilidade do cantor atender ao pedido do público e executar uma canção que, a princípio, não consta no repertório. A partir dessa lista, fazemos a distribuição dos direitos autorais.
w JC – Pelo visto, o ECAD tem que confiar na ética do produtor, com relação a esta lista, não?
GV – Esperamos que as pessoas sejam honestas a ponto de relatarem justamente aquilo que é executado. O ECAD não pode dispor de um número suficiente de funcionários para fiscalizar todos os eventos musicais que aconteçam no país. Trabalhamos com a hipótese dessa honestidade, confiando na relação das obras que são executadas num show.
w JC – No Carnaval deste ano, em Salvador, o ECAD testou um aparelho de gravação automatizado em trios elétricos, uma espécie de fiscal eletrônico. Como ele funciona realmente?
GV – Hoje, em dia, o que acontece, principalmente no Carnaval de Salvador, que é um dos que tem maior número de operadores de gravação, é o seguinte: uma pessoa, funcionário ou contratado pelo ECAD, fica em cima de um trio elétrico, para fazer a gravação das obras executadas durante o trajeto carnavalesco. Só que esse fiscal tem uma limitação nessas gravações, por conta da duração desses trajetos de quatro até seis horas. Então, termina-se não gravando todas as execuções. O ECAD, este ano, inovou, utilizando um gravador eletrônico digital, que grava até 17 horas. Então, a gente eliminou o operador e fixou o gravador num local do trio, onde podíamos captar todas as execuções, do início do trajeto até o final.
w JC – A região Norte/Nordeste tem um valor de arrecadação, em termos nacionais de 10, 5 %. Levando-se em consideração que estamos praticamente nos referindo à metade do país, este valor não é baixo?
GV – Estamos falando também de regiões que têm menos atividades econômicas e também ocorrem poucos shows, se comparado ao Sudeste, por exemplo. O eixo Sul/Sudeste é o grande motor de arrecadação nacional, mas isso não quer dizer que os artistas provenientes das outras regiões não lucrem em cima das execuções de suas músicas. Existem muitos nordestinos e nortistas que são grandes arrecadadores, ainda que existam alguns problemas de arrecadação no Norte/Nordeste por inadimplência.
w JC – Quem seriam esses inadimplentes?
GV – Muitas emissoras de rádio não pagam ao ECAD o que deveriam. No Maranhão, por exemplo, 80 % das emissoras são inadimplentes, no Pará, esse número sobe para 92 %. No Sul/Sudeste isto não acontece. Muitas prefeituras também aparecem no rol dos inadimplentes.
w JC – A unidade de Sergipe foi criada há um ano, cobrindo os Estados de Sergipe e Alagoas. Porque houve esta necessidade?
GV – Na realidade, a unidade da Bahia agregava o Estado de Sergipe e Alagoas, fazia parte da unidade de Pernambuco. Mas Sergipe veio num crescente com relação à arrecadação, de modo que justificou que criássemos uma unidade aqui, para ficar mais próximo da clientela, sejam os considerados externos, como os internos.
w JC – Quando uma banda faz uma versão em português de uma canção, originalmente de outro país, ela paga ao autor da música? E como o ECAD distribui o dinheiro da execução dessa versão?
GV – Na realidade, quando ela faz uma versão, a banda já tem que ter a autorização prévia do autor para fazer isso. A autorização pode ser gratuita ou não, agora na hora que eu for distribuir o valor arrecadado, parte deste valor vai para o autor da versão original e parte vai para o versionista. As associações de direitos autorais que integram o ECAD é que fazem essa distribuição para as associações internacionais.
w JC – Como o músico, o compositor deve proceder para receber pela execução de seu trabalho musical?
GV – Ele deverá se filiar a uma das 10 associações que integram o ECAD (ABRAMUS, AMAR, SBACEM, SICAM, SOCINPRO, UBC, ABRAC, ANACIM, ASSIM, SADEMBRA). Uma vez feita sua filiação, faz também o registro de suas obras e esses dados são enviados ao ECAD, de modo que uma música de sua autoria que seja executada, nós tomamos conhecimento e passamos o valor correspondente para a associação que o músico se filiou.
w JC – Este ano, o ECAD está completando 30 anos de atividades. Com isso, pretende comemorar as três décadas de atuação, lançando um CD de Ouro, um folder e um vídeo dos 30 anos. Fale um pouquinho sobre esses produtos.
GV – Cerca de duas mil pessoas (jornalistas, usuários de música, entidades ligadas à música e à cultura e formadores de opinião) escolheram uma música para fazer parte do CD de Ouro. As 10 músicas mais votadas farão parte do disco e, após a prévia autorização junto aos autores, estaremos gravando-o. Até o final do ano esse kit, que conta ainda com um folder e um vídeo mostrando a importância da música em diversas fases da nossa vida, deverá ser lançado.
w JC – Com relação ao “Música Brasil”, que é um projeto que o ECAD já desenvolve há algum tempo, como tem sido a receptividade dos participantes?
GV – A receptividade tem sido muito boa. Através do “Música Brasil”, o ECAD realiza palestras em universidades, em associações de classes, com formadores de opinião, divulgando não só as suas funções como também esclarecendo sobre a lei dos direitos autorais. Essas palestras são gratuitas e muito elucidativas com relação ao funcionamento do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição.