Em um ano de shows proscritos, em que até a música de elevador foi escassa, a arrecadação de direitos autorais pelo Ecad encolheu 20% e ficou abaixo do bilhão pela primeira vez desde 2012. Mesmo assim, os R$ 896 milhões foram recolhidos com alívio: quando tudo fechou, esperava-se que uma pandemia de poucos meses derrubaria o volume anual em 30%.
Se o coronavírus está aí até hoje, o Ecad conseguiu aliviar o baque concentrando esforços nas alternativas digitais à música ao vivo e em muita negociação com comerciantes que, em momento de crise, não têm o pagamento de direitos autorais como prioridade.
— Pra gente, uma queda de 20% é muito melhor do que estávamos esperando. Ela se deu graças ao crescimento dos meios digitais. Além disso, grande parte do trabalho consistiu em monitorar os estabelecimentos que estavam abrindo e negociar os pagamentos devidos, inclusive o que estava em atraso — contou à coluna Capital Isabel Amorim, superintendente que assumiu o Ecad no fim de 2019, após carreira como executiva em empresas jornalísticas como The New York Times Syndicate e El País.
Quando uma música é tocada de maneira pública — do buffet infantil à cena aleatória de uma série obscura no Netflix —, os executores precisam pagar direitos autorais aos artistas envolvidos. É o Ecad, uma empresa privada sem fins lucrativos, que concentra a arrecadação e a distribuição desses direitos. Ele tem regras de cálculo diferente para cada ambiente e ocasião de execução.
Serviços digitais representam um quinto do total
Tradicionalmente, a maior parte dos direitos é gerada na televisão, no comércio (lojas, academias etc.) e em shows. Em 2019, eles representaram, respectivamente, 37%, 23% e 16% da arrecadação. Embora a TV tenha ganhado força na quarentena, a arrecadação nos shows despencou a quase zero (com exceção do primeiro trimestre), enquanto a do comércio foi reduzida para 17%.
A perda foi parcialmente compensada por serviços digitais como o streaming, cuja fatia do bolo aumentou de 12% para 20% em um ano — sua maior participação até agora.
— Estabelecemos uma equipe para cuidar dos meios digitais e olhar, por exemplo, o fenômeno das lives, um mercado novo pra gente — afirma Isabel, admitindo, porém que a arrecadação com as transmissões ao vivo ainda é desprezível: — O faturamento da live como negócio é muito pequeno, nem se compara com o que é gerado pelos shows. Mas temos que monitorar.
Arrecadação
A distribuição de direitos ficou em R$ 947,9 milhões em 2020, atingindo 263 mil compositores, músicos, intérpretes, gravadoras etc. Foi uma queda de 4% ante o ano anterior. A diferença em relação à arrecadação se deveu, por exemplo, ao início da distribuição de direitos conexos no streaming e à liberação de créditos retidos por falta de informações cadastrais.
Batalha com hotéis
Nas negociações com os setores para o pagamento de direitos autorais, Isabel afirma que houve um embate com os hotéis. O setor entende que não deve pagar pelas músicas tocadas dentro dos quartos, enquanto o Ecad defende que, por serem ambientes de uso coletivo, os aposentos também são passíveis de cobrança. Atualmente, os hotéis estão pagando com base na taxa de ocupação que informam ao Ecad — deprimida pela pandemia —, mas não se chegou a um acordo definitivo.
2021 difícil
Para este ano, a expectativa de arrecadação dependerá, claro, da evolução da pandemia. O fiel da balança será o segmento de shows.
— A gente imagina que, se os shows voltarem, conseguiremos ter algo um desempenho um pouco melhor do que o ano passado — afirma a superintendente.
Será um desafio, porém. O Ecad trabalhava com a expectativa de que a vacinação avançaria até abril e o mercado voltaria próximo ao normal por volta de julho:
— Nesse cenário, voltaríamos a ter show em julho. Mas claro que não como nos anos anteriores. O varejo também não volta 100% em julho, porque as empresas retornam com menos fôlego.